Ismael Borges se tornou uma referência quando se quer falar sobre o varejo de livros no País. Ele é o gestor da ferramenta Nielsen BookScan Brasil, que monitora a venda de livros em livrarias, supermercados, lojas de autoatendimento e e-commerces no Brasil. É da sua mesa que saem os dados para compor o Painel do Varejo de Livros no Brasil. O relatório, realizado em parceria com o Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL), faz uma fotografia mensal do desempenho do varejo de livros no país. Nesta entrevista, ele analisa os dados atuais do Painel, reflete sobre o papel dos e-commerces e do reflorescimento das livrarias físicas em São Paulo.

Happy Hour Nespe – Segundo o Painel do Varejo de Livros, houve uma queda nas vendas nos últimos dois últimos meses. Apesar disso, no acumulado do ano, o varejo continua no azul. Há chances de a gente fechar 2022 com vendas acima daquelas registradas em 2021?

Ismael Borges – Se o número em questão é uma comparação do período atual em relação ao mesmo período do ano anterior, é importante voltar ao passado para explicar o presente. Dois mil e vinte um foi o retorno a uma rotina comercial com evolução no decorrer do ano. O segundo semestre daquele ano apresenta taxas maiores do que o primeiro semestre. Apesar de ser um movimento esperado, já que Black-Friday e Natal puxam essa média para cima, é possível afirmar que se atingiu resultados robustos no mercado geral do ano em questão. Essa ótima notícia de 2021 se converte em desafio na atualidade. A repetição daquela elástica taxa de crescimento de 2021 fica condicionada a um desempenho excepcional nos próximos meses.

HH – Outra discussão importante sobre o varejo de livros no Brasil é que as lojas virtuais têm mostrado sua predominância nas vendas. Você acredita que haverá, num futuro próximo, espaço para livrarias de argamassa e tijolo?

IB – A disponibilização do conteúdo, permeando tanto o meio técnico de contato com a matéria quanto os seus canais distribuição, sempre leva o debate a um campo incerto. Especialistas e apaixonados por alguma vertente já esmiuçaram a questão com previsões conservadoras e apocalípticas. É inegável que a tecnologia arrasta os desatentos e rebeldes, mas também muito já se falou sobre a experiência. Num futuro próximo, ou não, eu sempre acredito que a compra do conteúdo por simples demanda tende a se dar por conveniência e oportunidade. Assim a internet está mais à mão (a não ser que, no meu caminho diário até a padaria, haja uma livraria). Mas a experiência continuará a ter o seu valor, e quando falo valor, também me refiro ao financeiro, o que justificaria também cobrar mais por essa experiência. Mas isso passa por um pacote de ressignificação do território livraria. Parece que corredores burocráticos tendem a não ser os favoritos de uma parte importante da demanda. Nada do que foi falado aqui impõe-se como regra dada a fluidez da demanda. São muitos países dentro de um só. Eu sou um entusiasta da tecnologia, mas não posso imaginar o meu mundo sem livrarias.

HH – Numa conta por baixo, a cidade ganhou quase dez livrarias entre 2020 e 2021. E como você analisa esse reflorescimento das livrarias físicas e independentes em São Paulo?

IB – Aqui estamos falando de um desses países dentro do outro que me referi na resposta anterior. Também me faz lembrar sobre a ressignificação do território livraria. O citadino paulistano não precisa de muitos cliques/horas para fazer se materializar um livro diante de si, então para que lojas físicas? Para a experiência. A questão passa longe de ser nova. Os livreiros mostram estar atentos de que o nicho também é um caminho interessante na convivência com o modelo megastore.