Na última terça-feira (08), o mundo celebrou o Dia Internacional das Mulheres. E o Happy Hour Nespe ganha edição especial para discutir a presença feminina na indústria do livro.

Embora não haja dados oficiais sobre a participação das mulheres no mercado editorial, há quem diga que elas são a maioria. No entanto, quando se olha para os altos escalões, isso ainda é muito desigual.

De acordo com a Nielsen, as dez editoras que mais vendem livros no Brasil são, na ordem: Companhia das Letras, Grupo Editorial Record, Sextante, Intrínseca, HarperCollins, Ciranda Cultural, Panini, Planeta, Rocco e Todolivro. Somente duas delas são dirigidas por mulheres: Record e HarperCollins.

Por isso, o Happy Hour Nespe convidou Roberta Machado, vice-presidente do Grupo Editorial Record, para o Bate-Papo da semana.

Happy Hour Nespe – Como você enxerga a participação da mão-de-obra feminina na indústria brasileira do livro? Temos um balanço entre homens e mulheres?

Roberta Machado – É um ponto a ser melhorado, ainda temos muito a caminhar com relação à participação da mulher na indústria brasileira do livro. Embora a gente perceba uma presença forte de nas áreas ligadas à produção editorial, quando vai para a liderança mesmo, os CEOs e os cargos de quem está no comando há uma dominância maior do homem. A própria diretoria do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel) são 13 membros dos quais quatro são mulheres, proporção de 70/30. É curioso porque a mulher é o público leitor, estamos falando de empresas cujo produto principal é consumido em sua maioria por mulheres. Reflete a própria estrutura do país, imagino que ocorra em outros setores.

HH – E como isso se resolve na Record?

RM – Na Record vejo isso bem mais equilibrado, mas é preciso dizer também que por uma questão de sucessão, a Record hoje é propriedade 100% de mulheres, então nós temos uma sensibilidade maior para a questão. A Sonia, minha tia, é nossa CEO, eu sou vice-presidente, minha irmã é a principal editora do selo jovem, temos uma diretora administrativa que é mulher, quatro dos cinco editores executivos são mulheres, enfim, temos mulheres ocupando os cargos mais importantes.

HH – Quais conquistas ainda faltam para que as mulheres alcancem nesse mercado?

RM – Falta ter maioria nos cargos de topo em editoras. As grandes editoras devem dar atenção a essa questão. Ainda é um mercado pequeno, em sua maioria de empresas familiares com os donos na linha de frente, mas a medida que os grupos forem se profissionalizando, acredito que se deva buscar a maioria feminina na linha de frente como regra mesmo. Depois da morte do meu pai, a gente enfrentou uma crise econômica muito forte, seguida pela recuperação judicial da Saraiva e da Cultura e depois pela pandemia. Nesse momento tão desafiador tomamos conhecimento de algumas conversas maliciosas, havia pessoas descrentes da nossa capacidade, acredito que tenha sim uma pontinha de machismo nessa descrença mas que logo, logo foi superada porque a Record está em um momento excelente, vem ganhando pontos de market share, ano a ano. Estamos com o resultado muito bacana, está no momento muito bom, então acho que essa é a melhor resposta.

HH – Bodour Al Qasimi, presidente da International Publisher Association, diz sempre que já se sentiu muito solitária, sendo uma mulher em um mundo liderado por homens. Segundo ela, isso aconteceu muitas vezes em reuniões de trabalho com seus pares, quase todos homens. Você já se sentiu assim alguma vez?

RM – As pessoas que estão à frente da Record são também as donas, isso faz toda diferença. Existe uma posição muito privilegiada quando você é a própria dona, as pessoas te escutam, então você sente menos o impacto de ser mulher, porque você é mulher e dona. É um pouco diferente do que a presidente da International Publishers Association comentou. Então assim, acho que não tenho nem lugar de fala para comentar sobre isso porque não disputo com nenhum homem nível de diretoria, nível de conselho. Então é uma situação muito atípica, seria injusto até eu dar o meu depoimento. Imagino que seja uma pressão muito grande porque a gente vive em uma sociedade machista. É claro que mesmo sendo donas, chama a atenção a dominância masculina quando se pensa nos nossos pares, os colegas donos de empresa, e a gente se preocupa com isso. Até mesmo a nossa representação de livrarias também é dominada por homens, pois os próprios interlocutores em grandes marcas do varejo de livro são homens na maioria. Os gerentes, diretores com quem a gente lida, diria que também há uma predominância masculina, numa proporção de 70%. A gente sente essa diferença. É uma luta que a gente precisa estar sempre atento e buscando melhorar a representatividade.